Histórias

"(...) O pior que há para a sensibilidade é pensarmos nela, e não com ela. Enquanto me desconheci ridículo, pude ter sonhos em grande escala. Hoje que sei quem sou, só me restam os sonhos que delibero ter. (...)" - Fernando Pessoa

18.3.05

Um Querer Visceral

Estou cansada mas não sinto fadiga corporal. Acho que é o cansaço de me sentir infeliz, por culpa de ninguém a não ser por minha própria.
Uma vez escrevi aqui acerca dos fantasmas dos quais tenho dificuldade em me libertar, mas que já quase mandei embora de uma vez. Só que os impertinentes teimam em voltar não sei bem de onde. Quase me sinto uma protagonista do "The Others", sem perceber afinal quem domina quem. Apesar das noites agitadas terem voltado tenho acordado sempre bem disposta comigo, mas hoje sinto este cansaço a apoderar-se dos meus pensamentos, como aquelas heras cheias de gavinhas que vão trepando e ocupando as paredes dos casarios antigos.
E venho notando que esta agitação volta, sempre q aparece alguém que me "mexe com os interruptores" de alguma forma diferente do que é habitual. Se pensar nisso com "cérebro de pensar", parece-me uma espécie de defesa minha (que no fundo acaba por ter exactamente o efeito contrário) relativamente à aproximação de uma nova pessoa na minha vida. E como existe algum receio (que não pensei ser tanto como agora me apercebo que é) desse momento, acabo por pensar em tudo o que está para trás (que já devia estar devidamente embrulhado em papel jornal e arrumado no sotão da minha cabeça) e a achar que momentos felizes como os de antes não vão voltar. A minha P. diz (e com muita razão como sempre) que para se receber tb tem que ser dar. Talvez ainda não tenha chegado a altura certa. Ou talvez tenha e eu não tenha percebido. Ou, talvez ainda, nunca chegue.
Depois isto tudo junta-se às exigências próprias que vêm com a idade. As pessoas que me despertam olhares diferentes, cheios de rir, de bom, de vontades e de mágico... Sinto-as sempre como as estrelas que caíam ao rebentar dos foguetes nas festas da aldeia (quando eu era pequenota) e que eu insistia em correr para apanhar: inalcançáveis. Talvez eu precise de tomar uma iniciativa, mas este meu "mau perder" relativo à rejeição às vezes é o impedimento de tentar. No fundo acho que preciso de sentir que alguém tb quer correr na minha direcção em vez de ser sempre eu, feita tonta, a correr sozinha numa linha recta que não tem meta. É isso! Preciso sentir-me querida. Querida assim de um modo visceral mas são, sem castrações. Daquele modo que se quer alguém que nos é precioso. Já sei que mta gente deve pensar que isto é um grande disparate e, pasmem!!!... Têm mta razão. E eu sei que o é, mas sinto-me sempre tomada por uma sensação de perda inicial sem sequer ter tentado. E já se sabe: "evitar a felicidade com medo que ela acabe, é a melhor maneira de se ser infeliz".
E o que pode parecer mais um pedaço de mim exposto sem grandes embaraços é exactamente o contrário; aquilo que não consigo dizer falando, precisamente pelo pudor que me causa.
Mas hoje não posso deixar de me sentir feliz; algumas das minhas gentes mais queridas lembraram-se de mim no meio do tempo contado para as suas coisas. Amanhã, aurora com a minha Mafalda e ocaso em casa da Ana, com direito a regabofe. E assim durmo de alma mais aconchegada.
Beijo, beijo, M.